Home > Opinião > Os riscos do desprezo aos profissionais especializados

Os riscos do desprezo aos profissionais especializados

iStockPhoto / Yurchello108 Confiar nos profissionais devidamente formados pode evitar graves consequências.

Quando estamos doentes vamos ao médico para pedir uma opinião especializada. Mesmo que consultemos mais de um profissional, dificilmente contrairemos suas prescrições, principalmente se o diagnóstico for mesmo ruim. Porém, quando se trata da necessidade de projetos na área de design, arquitetura e engenharia civil, muitos clientes acreditam já possuírem todo o conhecimento necessário para a execução do mesmo, deixando aos contratados apenas a tarefa de cuidar das burocracias e afirmar uma responsabilidade técnica.

Esta falta de confiança e credibilidade naqueles que realmente possuem o conhecimento e a experiência leva à criação de obras de péssima qualidade estética e construtiva e sem nenhum conforto e segurança aos usuários.

Neste mês de abril, o Brasil se chocou com a notícia da queda de uma ciclovia na cidade do Rio de Janeiro, com duas vítimas confirmadas até o momento. Acreditava-se que esta obra seria um dos legados deixados pela prefeitura após as Olimpíadas deste ano. Porém, este incidente lamentável poderia ter sido evitado, sim.

A atual legislação brasileira permite que obras públicas sejam executadas presando não pela qualidade, mas pelo baixo custo. Os projetos, inicialmente idealizados por engenheiros e arquitetos, são repassados para elaboração e gerenciamento das empreiteiras, no chamado “contrato integrado”. Então, preços, prazos e ideias são desrespeitados, colocando em dúvida a qualidade final destes serviços. O que, infelizmente, pode ser provado neste incidente.

Acontece que, aqui em nosso país, criou-se uma cultura de que “planejar é uma perda de tempo”, mas não é. Sabemos que uma coisa só é boa quando realizada em seu tempo. Obras feitas apressadamente, no calor de ver um problema ser resolvido com rapidez, têm mais chances de dar errado. Conduzir as coisas dessa maneira é uma enorme irresponsabilidade. E as consequências nós já conhecemos. Talvez o motivo disso tudo seja a aflição do povo em querer adquirir aquilo que há muito é prometido pelos governantes e não cumprido.

Para suprir falta de conhecimento ou de dinheiro, muitos brasileiros recorrem a soluções em revistas, sites, blogs e outras fontes. É inegável dizer que, nos dias de hoje, o fácil acesso à informação, principalmente através das redes sociais, fez com que muitos anônimos se tornassem formadores de opinião. Em alguns casos, isto pode ser um problema. O caminho aparentemente mais fácil também pode ser aquele inadequado.

Voltemos, portanto, à primeira questão. Será que, ao invés de consultar um médico nós confiaríamos cegamente a nossa vida e de nossos entes queridos a opiniões de pessoas sem informação e formação médica? Esta mesma pergunta deveria valer para outras áreas profissionais. Pesquisar para ter uma opinião, sim, sempre. Menosprezar a opinião de pessoas com experiências teóricas e práticas, nunca.

É muito difícil para um projetista, por exemplo, lidar com “formadores de opinião”. Normalmente, já na primeira reunião com o arquiteto ou engenheiro, este tipo de cliente apresenta um rabisco confuso e incompleto, acompanhado de imagens plagiadas da internet, dizendo que já projetou tudo e que apenas quer alguém para passar o desenho a limpo e executar a obra. O profissional fica, então, em uma posição bem complicada, já que não quer perder o cliente, mas precisa convencê-lo de que nada daquilo é, de fato, um projeto.

Projetar é algo complexo e cabível apenas àqueles que realmente estão aptos a isto, tanto pelo conhecimento quanto pela legalidade. Quem aceita se responsabilizar por um projeto do qual não houve planejamento técnico, acompanhamento de execução, aprovação municipal e cumprimento de normas está ferindo a ética profissional.

Sobre as obras públicas no Brasil, infelizmente, como é visto em muitos outros setores, quem manda ainda é a política. Neste “jogo de interesses” a população sai prejudicada. Os governantes, inflados por seus cargos de altos salários, sentem-se no direito de tomarem decisões importantíssimas sem consultarem nem os órgãos especializados e nem a própria população. O resultado disso são estas obras precárias espalhadas por todo o território e vitimando cada vez mais pessoas inocentes.

Caberia a cada um de nós entendermos quais são os nossos limites. Podemos falar de tudo, e a internet nos deu mais liberdade para isto, o que não quer dizer que estejamos sempre certos. Na vida, aprenderemos muitas coisas, mas é impossível absorvermos tudo o que há. Seríamos mais eficientes se confiássemos no outro e agíssemos em grupo, cada qual se dedicando à sua área.

Embora ainda haja muitas deficiências na educação brasileira, não podemos desacreditar no valor daqueles que buscam aprimorar os seus conhecimentos em sala de aula. Pois é somente através da educação, do aprendizado de qualidade e da aplicação correta destes conhecimentos que um país consegue soluções belas, harmônicas, econômicas, sustentáveis, duradouras, eficientes e seguras para todos.

Matérias Relacionadas