Quando estamos doentes vamos ao médico para pedir uma opinião especializada. Mesmo que consultemos mais de um profissional, dificilmente contrairemos suas prescrições, principalmente se o diagnóstico for mesmo ruim. Porém, quando se trata da necessidade de projetos na área de design, arquitetura e engenharia civil, muitos clientes acreditam já possuírem todo o conhecimento necessário para a execução do mesmo, deixando aos contratados apenas a tarefa de cuidar das burocracias e afirmar uma responsabilidade técnica.
Esta falta de confiança e credibilidade naqueles que realmente possuem o conhecimento e a experiência leva à criação de obras de péssima qualidade estética e construtiva e sem nenhum conforto e segurança aos usuários.
Neste mês de abril, o Brasil se chocou com a notícia da queda de uma ciclovia na cidade do Rio de Janeiro, com duas vítimas confirmadas até o momento. Acreditava-se que esta obra seria um dos legados deixados pela prefeitura após as Olimpíadas deste ano. Porém, este incidente lamentável poderia ter sido evitado, sim.
A atual legislação brasileira permite que obras públicas sejam executadas presando não pela qualidade, mas pelo baixo custo. Os projetos, inicialmente idealizados por engenheiros e arquitetos, são repassados para elaboração e gerenciamento das empreiteiras, no chamado “contrato integrado”. Então, preços, prazos e ideias são desrespeitados, colocando em dúvida a qualidade final destes serviços. O que, infelizmente, pode ser provado neste incidente.
Acontece que, aqui em nosso país, criou-se uma cultura de que “planejar é uma perda de tempo”, mas não é. Sabemos que uma coisa só é boa quando realizada em seu tempo. Obras feitas apressadamente, no calor de ver um problema ser resolvido com rapidez, têm mais chances de dar errado. Conduzir as coisas dessa maneira é uma enorme irresponsabilidade. E as consequências nós já conhecemos. Talvez o motivo disso tudo seja a aflição do povo em querer adquirir aquilo que há muito é prometido pelos governantes e não cumprido.
Para suprir falta de conhecimento ou de dinheiro, muitos brasileiros recorrem a soluções em revistas, sites, blogs e outras fontes. É inegável dizer que, nos dias de hoje, o fácil acesso à informação, principalmente através das redes sociais, fez com que muitos anônimos se tornassem formadores de opinião. Em alguns casos, isto pode ser um problema. O caminho aparentemente mais fácil também pode ser aquele inadequado.
Voltemos, portanto, à primeira questão. Será que, ao invés de consultar um médico nós confiaríamos cegamente a nossa vida e de nossos entes queridos a opiniões de pessoas sem informação e formação médica? Esta mesma pergunta deveria valer para outras áreas profissionais. Pesquisar para ter uma opinião, sim, sempre. Menosprezar a opinião de pessoas com experiências teóricas e práticas, nunca.
É muito difícil para um projetista, por exemplo, lidar com “formadores de opinião”. Normalmente, já na primeira reunião com o arquiteto ou engenheiro, este tipo de cliente apresenta um rabisco confuso e incompleto, acompanhado de imagens plagiadas da internet, dizendo que já projetou tudo e que apenas quer alguém para passar o desenho a limpo e executar a obra. O profissional fica, então, em uma posição bem complicada, já que não quer perder o cliente, mas precisa convencê-lo de que nada daquilo é, de fato, um projeto.
Projetar é algo complexo e cabível apenas àqueles que realmente estão aptos a isto, tanto pelo conhecimento quanto pela legalidade. Quem aceita se responsabilizar por um projeto do qual não houve planejamento técnico, acompanhamento de execução, aprovação municipal e cumprimento de normas está ferindo a ética profissional.
Sobre as obras públicas no Brasil, infelizmente, como é visto em muitos outros setores, quem manda ainda é a política. Neste “jogo de interesses” a população sai prejudicada. Os governantes, inflados por seus cargos de altos salários, sentem-se no direito de tomarem decisões importantíssimas sem consultarem nem os órgãos especializados e nem a própria população. O resultado disso são estas obras precárias espalhadas por todo o território e vitimando cada vez mais pessoas inocentes.
Caberia a cada um de nós entendermos quais são os nossos limites. Podemos falar de tudo, e a internet nos deu mais liberdade para isto, o que não quer dizer que estejamos sempre certos. Na vida, aprenderemos muitas coisas, mas é impossível absorvermos tudo o que há. Seríamos mais eficientes se confiássemos no outro e agíssemos em grupo, cada qual se dedicando à sua área.
Embora ainda haja muitas deficiências na educação brasileira, não podemos desacreditar no valor daqueles que buscam aprimorar os seus conhecimentos em sala de aula. Pois é somente através da educação, do aprendizado de qualidade e da aplicação correta destes conhecimentos que um país consegue soluções belas, harmônicas, econômicas, sustentáveis, duradouras, eficientes e seguras para todos.