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Arquitetura é profissão, não um hobby

© Depositphotos.com / AndreyPopov O arquiteto projeta e organiza espaços internos e externos, de acordo com critérios de estética, conforto e funcionalidade.

Após a colação grau, é muito comum o arquiteto aprimorar a sua experiência prática realizando projetos simples, tendo como clientes os seus amigos e os seus familiares. Este momento é importantíssimo. É no início da carreira em que muitos dos medos, inseguranças e inibições, ainda presentes, podem ser superados. Às vezes, neste momento, os arquitetos consideram desnecessário seguir certas formalidades, como a elaboração e assinatura de um contrato de prestação de serviços ou o emprego da tabela de honorários do sindicato, por terem confiança nestes clientes. Mas tanta intimidade entre as partes pode tornar-se um desafio.

Todo profissional sente-se confiante em seu trabalho quando o mesmo é reconhecido. O respeito é primordial. Sendo isto demonstrado pelos seus colegas de trabalho, parceiros e clientes, ele consegue exercer melhor a função pela qual foi contratado. O respeito é percebido quando a sua opinião e conhecimento são levados em conta e quando as críticas são lógicas e construtivas. Mas, no início da carreira, o arquiteto esbarra em situações onde a sua capacidade de conduzir o exercício profissional é colocada à prova. Mesmo ele tendo muita criatividade, dedicação e comprometimento, pode ser subestimado por aqueles que mais o conhecem.

O abuso da função também é comum. Cedendo, pela inexperiência, o arquiteto não consegue cobrar o mínimo pelo seu trabalho e nem estabelecer um prazo final para a sua execução, ficando a mercê de clientes que, pela amizade, acabam pedindo consultoria particular e gratuita constante. É difícil dizer não. Assim como profissionais de outras áreas, como medicina, odontologia e advocacia, em todo o momento e lugar o arquiteto é lembrado pelo seu ofício, recebendo perguntas que exigiriam respostas técnicas. Mas, durante as conversas, é necessário deixar claro que somente em seu ambiente e horário de trabalho é realizado o atendimento profissional.

Dentro do seu domicílio a cobrança não diminui. A casa de um arquiteto parece substituir o seu cartão-de-visitas. Por vezes, a sua capacidade de projetar é julgada pela aparência do lugar onde vive. Existe o medo constante de ouvir a tão temida expressão ‘casa de ferreiro, espeto de pau’. Portanto, ele acaba reservando parte do seu dia com o planejamento de projetos e reformas para a sua residência e para as de seus parentes. E é justamente no ninho familiar onde o desafio é maior.

A intimidade é complexa e varia conforme cada relacionamento. De qualquer forma, este sentimento, quando entre o arquiteto e seu cliente, pode ser tanto libertador quanto um limitador. Embora, neste caso, o arquiteto sinta-se mais a vontade para expor as suas ideias, ele também recebe respostas mais diretas e francas e isto é difícil de lidar. É importante manter, apesar de tudo, postura profissional e firmeza de decisões. A obrigação do arquiteto é, também, ouvir atentamente tudo que lhe é solicitado. O que não possa ser concordado pelo profissional tem que ser justificado de forma calma e paciente, mais do que seria se este estivesse lidando com outros clientes. Isto ameniza os possíveis desentendimentos.

Outra situação enfrentada pelos arquitetos é quando uma pessoa amiga precisa resolver questões legais com a prefeitura. Muitos optam por realizar uma obra por conta própria, sem a supervisão de um profissional graduado na área da construção civil. Mas, para a regularização do imóvel e suas futuras transações de compra e venda, há a necessidade da aprovação do projeto pela prefeitura municipal. É neste momento que o arquiteto é solicitado. Como um favor, pedem-no que realize as plantas baixas e assuma a responsabilidade técnica. O perigo de o profissional realizar este serviço é envolver o seu nome em um projeto no qual não idealizou, não planejou e nem acompanhou a sua execução. Existem muitos riscos envolvidos nisso. A experiência adquirida em acompanhar os trâmites legais, passo-a-passo, é pouco em comparação ao que pode vir a acontecer com este profissional se a edificação apresentar  patologias posteriormente.

Apesar de tudo, realizar trabalhos para amigos e familiares é positivo. Sabendo lidar com a situação e tomando as devidas precauções, sempre se adquire experiência, não importa o resultado. No início da carreira, serve como exercício prático. Nos anos seguintes, serve como uma renda extra. Muita intimidade, descredibilidade, subestimação, superestimação, ou qualquer outro sentimento, só pode ser superado de uma forma, com trabalho. O que for bem feito vale como divulgação. Infelizmente, tudo tem um custo e o arquiteto não exerce arquitetura como hobby, mas como profissão. Então, independente de quem seja o cliente, é preciso valorizar todo o tempo em que o arquiteto gastou com estudo e trabalho e respeitar as atribuições no qual a ele foram concedidas.

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